Desejou boa noite ao porteiro do clube, amarrou o cadarço do tênis, colocou o fone de ouvido e seguiu para casa.
Distraída no caminho, lembrou-se subitamente do sonho da noite passada, em que voava. Olhou para o céu, como que por instinto, e foi quando recebeu o primeiro pingo de chuva diretamente no queixo.
O céu era tomado por um tom cinza-chumbo relampejado de quando em vez por clarões. Uma beleza exótica.
Parou por um segundo, os olhos fixos nos pingos que desciam cada vez mais rápido, e permitiu-se saborear.
Respirou fundo, sentindo o cheiro de terra molhada; amarrou os cabelos, para sentir melhor a chuva; retirou o fone de ouvido, para ouvir os sons do mundo; fechou os olhos, para ver apenas com os outros sentidos; estendeu ambos os braços, a fim de tocar a água que descia do céu; abriu a boca, deixando a água preenchê-la totalmente; largou a bolsa ao chão, para suportar apenas a leveza da chuva.
Enfim, durante aquele milésimo de eternidade, comungou com seu espírito e foi tudo o que nasceu para ser...
Daí para frente, quem a descreve é o silêncio.
(...)
Thuan B. Carvalho