26 de abr. de 2011

Desperdida




A tarde avançava penosa, sem chuva e sem prosa, arrastando o dia


As horas - não queria ver, evitava saber! - mas ele já sabia


E junto ao clamor do coração, junto a toda a paixão, junto a toda magia


Junto ao outono que proclama o inverno, seu momento eterno lento se esvaía.





A sensação apertava seu peito, mas não tinha jeito, era a despedida


Por mais que o rapaz quisesse, com choro ou com prece, não tinha saída


Chegou a perder o respeito, bradou de mau jeito, contra a própria vida


E o tempo, mentor da quermesse, bradava: “se apresse!”, vou dar a partida.




Iansã, quão covarde e difícil é largar o meu vício por ter que partir!


Depois de tanta intimidade, lascívia, vontade que não vai sumir


Meu corpo em seu corpo era bruma, sereno e espuma, magos do porvir


E agora sou como orvalho que nasce do galho e não quer mais cair





Aquele momento infinito, cigano erudito, gravara-se a fundo


O amor sublimou tão sagrado, carícia e agrado, poema fecundo


E aquilo era contradição, pois seu coração comungava com o mundo


Mas já quando estrada pegava a saudade apertava no mesmo segundo.





Então toda aquela bonança ao virar lembrança era um tormento


Ele clamava sua Deusa de fogo - seu carma, seu jogo - no mesmo momento


E os Deuses se deliciavam porque se gabavam saber seu intento


E faziam se encontrar novamente, regavam a semente daquele amor violento.





O reencontro não era normal, o plano era astral, como antigamente


Quando os reis temiam pela magia, o padre só dormia com a igreja silente


Mas para ambos era o bastante, ele anjo errante ela estrela-cadente


Guiados pela coincidência, prazer da existência, num mundo doente.




A compreensão logo o tocou, seu corpo levou um pequeno recorte


E ele então se acalmava, não mais reclamava da falta de sorte


Sabia que mais cedo ou mais tarde a sua metade viria a pinote


E surgiria vestida de lua, tal qual alma nua, pra seu Dom Quixote.





Thuan B. Carvalho