22 de jun. de 2010

Anjos e Demônios


“Seu defeito e sua qualidade, seu ápice e sua ruína, unidos na loucura de suas concepções, tornavam-no anjo enquanto demônio. Um anjo sagaz e atuante, protetor e onipresente - um remédio a qualquer desatino; um demônio voraz e sufocante, malfeitor e inteligente - um veneno sem qualquer antídoto.”


Sem saber da profecia que o acompanhava, elas se apaixonavam. E com freqüência. A verdade nua e crua é que nem ele sabia que tais palavras haviam sido marcadas a ferro em sua alma, e que delas jamais conseguiria se livrar. Não que quisesse, claro.


E era sempre assim. Ele conseguia ser tudo o que elas desejavam de um homem, lendo olhares e pensamentos, sabendo de gostos e segredos, parecendo realmente não fazer parte daquele conglomerado de brutamontes que se diziam mais homens por terem mais mulheres, sem saberem dar o valor a cada uma delas. Tinha sempre nos lábios a palavra chave, o refrão correto, o poema oportuno, a gíria engraçada, o pensamento que completasse.


E num piscar de olhos, na simples reviravolta de um momento, ele sumia.


E não havia telefonema que tocasse, não existiam horas nas quais ele se encontrava em sua casa, ele não tinha mais vida social, não aparecia nos lugares, não retornava a caixa postal, e nem nada. Mas é claro. Seus lábios, doces e venenosos, com certeza já haviam profetizado algo do tipo; algo como uma “mudança de humor” que fosse explicá-lo posteriormente. E era simplesmente assim, parecia que seu lado demônio confabulava com seu lado anjo, e ele projetava teias complexas das quais somente ele saía, mas que prendiam em seu centro, completamente inativos e capturados, os sonhos intermináveis que ele prometia no terceiro encontro.


E quanto a você, você permanece em seu mundo, acreditando com veemência que a culpa foi toda sua. Que você não soube lidar com aquela perfeição em forma de humano, com aquele que finalmente seria o cara certo.


E se encontram dois meses depois, na mesa de um bar. Ele, sorrindo, levanta-se de onde estava para cumprimentá-la, dando um abraço apertado, e perguntando como vai sua vida. Ela sorri, apenas para retribuir o gesto, mas a interrogação em sua cabeça não é diferente das outras tantas. Ele parecia não conter mais aquela ligação, parecia não se lembrar mais dos momentos que viveram juntos. Ela procurava sentir aquela alma tão ofuscante, tão presente, tão imponente, mas tudo o que sua alma captava agora da alma daquele estranho era uma frase tão abstrata quanto aqueles momentos passados juntos pareciam agora:



“amor, eu não estou em lugar nenhum.”



~ Thuan B. Carvalho

18 de jun. de 2010

Rima e Solidão



Na maioria das vezes não é escolha

Nem se trata simplesmente de opção

A poesia surge do nada - feito bolha

Que se sopra daquela “água com sabão”

E dali para frente pronto: é poeta

Com os conhecidos ônus da profissão

Incluindo o principal, que acarreta

A proximidade entre aquele e a solidão



Resta somente aprender a separar

E se apossar da solidão na hora certa

Naquela máxima de “dividir pra conquistar”

Sendo hora sol, hora lua, hora mar

Sem deixar a pobre alma inquieta



É aqui que me procuro e não me acho

E confesso até que às vezes choro baixo

Na ânsia trôpega de conseguir me rotular

Pois se o poeta é - fêmea e macho - união

Entre a vazia madrugada e a solidão

Como é que eu poderia me encontrar?



E esse medo de permanecer indefinido

Cogitando poeta nunca eu ter sido

Fez-me caçar o meu lugar a existir

E após breves delongas, o consentimento

Sou “meio-poeta”, e eis aqui o fundamento -

Tenho as palavras mas não tenho O sentimento.




- Thuan B. Carvalho