14 de mai. de 2010

Nostalgia


Até hoje de manhã, eu realmente desconfiava das coisas. Desconfiava porque é da minha natureza desconfiar. Como é também da natureza do homem comprovar, testar, aprovar, afirmar! Tudo tem que ser certeza. E a certeza doeu amarelo-doença nos olhos, e ardeu cinza-chumbo no estômago. É a dor da nostalgia, a certeza de que não volta mais, a vontade de um dia-a-dia que simplesmente já se fora, de uma intensidade que infelizmente foi-se bruma, sombra de árvore em dia nublado. Sentado no banco daquela praça foi que eu acreditei nas coisas. E as coisas mudam.


Quem pediu bancos novos, chão pintado, canteiros sintéticos, ferros novos, luzes potentes, postes pintados; simetria exata de uma solidão moderna?

Quem encomendou esse futuro sem sorrisos, sem pés descalços e sangrentos, sem pipas, sem peões, sem futebol, sem terra, sem poeira, sem sujeira; assimetria inexata de uma coletividade ultrapassada?


Nunca imaginei que fosse dessa maneira. Em meus sonhos infantis, pensava em minha vida exatamente como está hoje, porém, achava que viriam outras crianças para assumirem o meu lugar subindo na árvore mais alta da praça. Ou na casinha de madeira. Ou na cabeça daquela estátua. Ou no alto do poste. Terrível engano. O poste é hoje perigoso para se subir, a estátua não existe mais, a casa de madeira é só um esboço do que outrora fora, e as poucas árvores estão lá, solitárias, olhando as poucas crianças que as deixam de lado para passarem, desatentas, distraídas demais com seu brinquedo eletrônico.


Porém, o que vejo agora é o pesadelo do que não vejo; e meu delírio é tentar achar um motivo, uma saída plausível para aquela destruição que se tornara factualmente normal. Tento de todas as formas achar normal a ausência de mim, de meu eu passado ali, não representado por uma alma sequer. As respostas não vem, e a falta delas traz uma vontade rouca de gritar, de culpar alguém; sobe de minha garganta o veneno mais mortal...


... e escorre pelos bueiros com o mar de meus olhos, levando consigo as cores vivas de um pretérito mais que perfeito; mas que jamais se conjugará no futuro.



Thuan B. Carvalho

Um comentário:

  1. Camila M. Demartini5 de nov. de 2010, 00:58:00

    Um dos meus preferidos! Vi você na minha frente agora. Perfeito! Amo você!

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