Abril. Abriu. Abril. Abriu. ...
Abriu-se. O trinco pende de lado,
opaco. Havia ali antes uma porta? Não saberia dizer. O cheiro de mofo
intrínseco à madeira sugeria velhice. As cores inerentes ao arabesco em sua
maçaneta sugeriam juventude. Cedo ou tarde, era tempo de atravessar. Olhos
abertos. Respiração lenta. Força. Coragem. Suor e lágrimas.
Folhas, muitas delas. Caídas.
Arrancadas. Leves e secas. Vermelhas. O Verão passou por ali, pensou. Árvores
nuas. Despidas de si. Paredes acinzentadas, construídas por pequenos ramos
disformes de galhos. Não, espera... Na verdade são... palavras? Palavras de
todas as classes e gêneros. A composição do local era a página de um livro
borrada. Palavras. Outrora lhe disseram tanto!
Sentou-se. Vazio. Onde é que estava
o silêncio? Em seu ouvido zumbiam a algazarra de mil vozes. Vozes. Vozes.
Palavras. Nenhum acorde. Cordas grossas passavam por todos os lados. Cordas
vocais que transportavam uma espécie de líquido. Opaco. Vazio.
Súbito. Arrojo. Ímpeto. Mãos
puxavam cordas. Unhas descascavam palavras. Rasgou todas as letras. Engoliu
algumas, cuspiu outras. Destroçou incessantemente. O local começou a se
revelar. Paredes tão vermelhas quanto poderiam ser. Um piso pulsante como um
vulcão. E quente. Um calor imenso começou a preencher o local.
Num único rompante, rompeu o
instante.
A pureza o tocou. Esvaziou-se de
palavras. Dali para frente, seriam ações. Revigorava-se. Vigor. Energia.
Sangue. Calor. Sentidos. Coração.
Satisfeito e coberto de sangue,
deixou apenas encostada a porta que se Abril.
Thuan Bigonha de Carvalho
Para prosa poética vide Thuan Carvalho, é o que há de melhor!
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